domingo, 27 de junho de 2010

Semy (Capitulo 007)

(Capítulos anteriores: 001, 002, 003, 004, 005, 006)

CAPITULO 7

Aquelas criaturas moravam num castelo rodeado por uma povoação, que por sua vez era protegida por uma forte e extensa muralha. Situava-se no cimo de um largo planalto. Em volta, estendiam-se planícies quase sem fim. Foi um acontecimento naquele dia a entrada das mulheres estranhas para todos. Subiram o acesso ao pátio do castelo em grande velocidade, aumentando ainda mais a curiosidade do povo da cidade. Frente à torre de menagem, centro de todo o castelo, os homens retiraram-nas dos cavalos sem qualquer tipo de gentileza. Para eles eram mais uma peça de caça. Com marcas de sangue dos animais abatidos na roupa, Jamie, Kate e Muriel olhavam para os espectadores no pátio. Jamie percebeu que as miravam aterrorizados e não desviavam os olhos dos cabelos. Era ali que se encontrava o maior receio. Tinha de perceber a razão.
O homem que chefiava aproximou-se delas e perante os muitos servos presentes, ordenou que as levassem para o interior do castelo. Dois dos guerreiros colocaram-nas aos ombros e assim as transportaram para o interior da torre. Mais intrigadas do que nunca, esperaram pelo gesto seguinte.
Num passo acelerado, chegaram rapidamente a uma grande sala onde as paredes se encontravam cobertas por belas tapeçarias. Os desenhos que representavam histórias daquele local, predominavam nas altas e largas tapeçarias. Quanto à mobília, apenas umas quantas cadeiras e uma grande mesa de modesto trabalho artesanal, tudo feito de madeira. Logo atrás, vivia uma lareira de pedra clara com o fogo quase apagado. Por vários sítios, viam-se alguns montes de almofadas. E foi para um deles que as atiraram. O mais velho, de quem partiam as ordens, dispensou os outros homens e chamou os servos. A estes, ordenou que trouxessem comida e algo para beber.
Aproximou-se das três mulheres e olhou para os restantes dois guerreiros na sala enquanto acariciava o punho da espada à cintura. Depois de ter admirado demoradamente as novas mulheres, deu ordens para cortarem as cordas que as seguravam.
- Ufa! Caramba! Estava a ver que nunca mais ficava livre. - sussurrou Muriel massajando os pulsos marcados pela corda.
Os homens retiraram a capa e a bainha com a espada e colocaram na mesa. Dois deles, sentaram-se nas cadeiras e colocaram os pés sobre a mesa. O que parecia ser o mais velho, encostou-se à mesma mesa e cruzou os braços. E foi este quem iniciou a conversa.
- Se tentarem fugir atiro-vos com a espada e morrem já. - Semicerrou os olhos e depois de beber num só trago um copo de vinho, acrescentou: - Agora que estão mais confortáveis... já podem começar a contar a vossa origem. Temos muito tempo para ouvi-las. Estou à espera. Quero a verdade. Senão... já sabem o que acontece... - E pegou na espada pousando-a sobre as pernas.
- Pois muito bem, se assim preferem...
- Não se trata de preferência trata-se de uma ordem.
Jamie respirou fundo e respondeu.
- Nós viemos de um outro... de um outro mundo muito distante daqui. Tão distante que nem a imaginação o alcança. Se nos perguntarem como chegámos a este lugar, não lhes poderei responder pois nem nós próprias sabemos. Aparecemos. Mas isso já pertence a um passado que queremos esquecer. É tudo o que tenho a dizer.
- É pouco... muito pouco.
- Esqueçam de onde viemos e digam-nos para onde vamos. - pediu Muriel a ajeitar a saia que usava debaixo de uma grande camisola com motivos florais. - É o que nos interessa presentemente.
Depois de um silêncio que pareceu uma eternidade e perante os olhares ferozes daqueles homens um deles falou.
- Temos de falar com o Wise Sage sobre este assunto. Ele deve ter algumas explicações. Estas mulheres são estranhas demais. Acho que chegou a altura de saberem algumas coisas sobre nós e sobre este lugar já que estão tão determinadas em viver o presente e esquecer o passado. O meu nome é Leo. Este é Dave, o meu irmão mais velho e...
- senhor deste lugar. Nós governamos esta cidade e mais algumas terras em seu redor. Como podem perceber - se é que têm capacidade para tal - somos nós quem manda aqui. Senhores absolutos, habituados a que os seus pedidos sejam satisfeitos sem a mais pequena recusa. Todos! - E olhou bem para os olhos das três mulheres - Aquele ali, é Clive um amigo de longa data que nos acompanha há anos e que é para nós como um irmão. - Bebeu outro copo de vinho e prosseguiu. - A cidade tem o nome de Semy. Este país é governado por duas forças: a nossa e por Dan Tolos.
- Ahh! A comida chegou! Estou esfomeado - interveio Leo enquanto que desapertava o fio em volta da bota.
Entraram na sala uma série de escravos que com rapidez, arrumaram sobre a mesa as várias iguarias e jarros de vinho e água. Tão inesperadamente como tinham surgido, desapareceram. O aparecimento das três mulheres de cabelos escuros era assunto do dia por toda a cidade. Olhavam-nas com curiosidade e uma certa dose de desconfiança.
Jamie, Muriel e Kate tentaram desviar o olhar da comida para não as fazer suplicar por um pouco pois não saberiam a reacção daqueles homens. Kate largou uma lágrima e Jamie abraçando-a sossegou-a.
- Estão com fome? - perguntou Dave sem desviar o olhar da peça de carne que comia.
- Um pouco - respondeu Muriel a medo.
- Podem aproximar-se. Sentem-se aqui, junto à mesa. - convidou Clive empurrando uma cadeira com os pés. - Comam!
Hesitando um pouco de início, acabaram por se sentar à grande mesa de madeira momentaneamente tapada por uma variedade de alimentos. Durante alguns minutos, os três senhores do castelo limitaram-se a observá-las com a devida atenção. Admiravam a maneira rápida e eficiente como limpavam os pratos e algumas travessas.
- Ainda bem que as encontrámos. Quando não... morreriam de fome. - comentou Dave quando retomou a sua refeição. - O que seria lamentável porque têm bons braços para trabalhar.
- Tem aspecto de serem boas trabalhadoras. Escravas destas jamais encontraremos neste país. Diria até que são demasiado preciosas.
E os três riram-se. Jamie achou que havia algo enigmático naquele elogio e decidiu inquirir um pouco mais.
- O que pretendem fazer de nós? Que trabalhos é que nos irão dar? Porque nos acham assim tão preciosas? Somos mulheres como tantas que vimos por aqui.
- Quem faz perguntas aqui somos nós. - replicou Leo a brincar com o seu punhal.
- Por favor, só queríamos saber o que vão fazer connosco. - insistiu Muriel.
- Vão saber em breve... - respondeu Clive atirando um osso para a lareira.
- Temos quantos escravos quisermos. Um dos nossos negócios é a compra e venda de escravos. - explicou Leo entre um sorriso de gozo.
- Podem descansar o vosso medo porque por enquanto não as iremos vender. - Os olhos que os dois homens lançaram a Dave pareciam não concordar com a ideia. - Pretendemos verificar como são a trabalhar em Semy. A vida nesta povoação não é fácil. Mas quem não arranjar problemas, não a achará assim tão difícil.
- São diferentes de todas as mulheres daqui... - sussurrou Leo aproximando-se de Dave. - Saberás bem o que estás a fazer?
Este lançou um olhar que calou o irmão.
- Tratarão das nossas roupas e quartos. - prosseguiu Dave. - E farão mais alguns trabalhos que Lann e nós ordenarmos. O chefe dos escravos chama-se Lann. Ele é o nosso homem de confiança. Tratar-vos-á bem. Isto é... desde que cumpram todas as suas ordens. Quando chegar a altura das colheitas, ajudarão também. Terão sempre que fazer em Semy. Esta é uma cidade de trabalho. Haverá dias em que pedirão para que o dia passe depressa.
- Aqui, os escravos são bem tratados, o mesmo não se passa em Nastro. - indicou Leo antes de beber de uma só vez o conteúdo do seu copo. Acabem de comer e esperem por Lann. Ele vos dirá onde irão dormir e vos dará roupas para vestirem.
- Hoje vão conhecer a povoação e saber os lugares onde farão as diversas tarefas. Despachem-se. - declarou Dave levantando-se da mesa.
Pegou a espada e colocou-a de novo à cintura. Olhou de novo para as três mulheres e acrecentou:
- Espero que tenham entendido bem o que aqui foi dito porque não tenho paciência para novas explicações.
E abandonou a sala com o irmão e amigo por uma das duas portas existentes na sala.
- Depois de tudo... acho que ainda tivemos sorte. - afirmou Muriel bebendo água. - E repararam como eles são tão giros?
- Só tu para reparares nisso agora. - resmungou Jamie passando as mãos pelo cabelo antes de se levantar da mesa.
- Apetece-me chorar. - confessou Kate - Sinto-me triste. Queria sair daqui. Queria tanto voltar à minha casa.
- Mas não podes. Estamos todas com medo neste momento. - declarou Muriel. - Precisamos de forças. Agora mais do que nunca.
- Uma nova vida acabou de nascer. - murmurou Jamie sem conseguir disfarçar a sua preocupação observando a povoação pelo vidro da janela.

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