segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Salpicos



Caminhamos juntos naquela rua abandonada. Os prédios reluzem com os pingos da chuva. Estruturas solitárias que clamam por atenção e que nos observam isolando-nos de tudo.
Por momentos, senti-me tão longe dali, tão segura...
Olhei para ti e sorri.
Percebeste que aquele sorriso não era comum.
"- O que estás pensar?" perguntaste intrigado e segurando-me na mão.
Olhei-te nos olhos e levantei o sobrolho cobrindo-te de expectativa.
Desviei a atenção para uma poça brilhante no meio do caminho.
Olhei-te de lado e de novo para a água.
Aproximei-me devagar e sem receio pisei o começo da água.
Retirei o pé e não controlando o calor que crescia dentro de mim, toquei-a outra e outra vez.
Devagar.
Muito devagar, quase a medo.
Virei-me para ti e sem perder aquele sorriso lascivo, comecei a mexer os pés acariciando cada pinga que me tocava.
Bati.
Bati com força e a água salpicou, tocando-me como tu me tocas...devoradora.
Tentaste dizer algo mas eu não te deixei.
Rodopiei, saltei cada vez mais. Toquei-me.
As gotas, sedentas, agarraram-se à minha roupa despindo-me.
Ciumento, enfurecido, puxas-me para ti. Mas quando ias beijar-me, sentes frios salpicos.
Miras-me em silêncio e deixas que a chuva te molhe e seduza a pele do rosto.
Adivinhas o que penso de tão bem me conheceres.
Admiras uma gota que perigosamente passa no canto dos meus lábios e, sem aguentares mais, beijas-me sequioso.
O toque atrevido e invasor leva-me a puxar-te para mim ainda mais.
E tu, sem dares tempo para o meu respirar, puxas-me contra uma parede discreta e semi-obscura. Permites que um raio de luz percorra o meu peito de roupas coladas, molhadas, provocadas.
Tocas a medo...
tocas dominador... no corpo que descobres outra e outra vez.
Usas as gotas como chicote de prazeres da roupa que libertas.
Usas o calor como aconchego do teu desejo nas esperas de outros beijos.
Rendida, naufrago no mar de arrebatamento, colo-me a ti deslizando como a água que nos enfeitiçou. Cantamos nos gemidos que a chuva acompanha nos pingos que salpicam em cada gesto que inventámos para mimar aquele momento.
Largamos gotas de satisfação e sorrimos quando tocamos o céu e paramos o tempo numa nova memória do que fizemos, ali...
despreocupados...
abundantes...
loucos...
Foram salpicos de gotas que nos tornaram cativos de uma arrebatadora vontade de descontrolo.

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